CONVITE DE CASAMENTO 
 

(Publicada em 1 de novembro de 1.996) 

Quando fui requisitado para a tarefa, éramos colegas de sala. Ele, paquerando uma garota há algum tempo, pediu-me para escrever algo para ela, como se fosse ele o autor do que seria escrito. O poema – foi o que ele me pediu – acompanharia um presente. Topei escrevê-lo, mas não sem deixar bem claro que, caso a conquista malograsse, não poderia ele me culpar de forma alguma. Afirmei também, alegando experiência própria, duvidar do poder da poesia como tática para a conquista. (Lembrei-me de um trecho lido no prefácio do livro “Cyrano de Bergerac”: “Rostand imediatamente relacionou a situação com a infeliz história sentimental de Cyrano de Bergerac, que, incapaz de conquistar para si mesmo o afeto de Roxana, a mulher amada, conquistou-o através de palavras apaixonadas, em nome do outro, para seu jovem amigo Cristiano.”)

Escrito o poema, pedi a ele que me mantivesse informado sobre a peleja. Foi com satisfação que fiquei sabendo que sairiam num sábado. Mais satisfação ainda foi constatar que o fato de eles saírem aos sábados foi se tornando a regra, até o ponto em que o namoro já era uma regra, e não seria exagerado afirmar que o amor é que parecia estar ditando as regras. O tempo passava e a relação se consolidava, como se ela fosse a Monica e ele fosse o Eduardo.

Aos domingos, eu geralmente almoçava na casa dele. Ela também se fazia presente. Como observador, eu freqüentemente pensava que aquela história seria coisa para casamento. Enquanto essa hora não vinha, ele e eu conversávamos amiúde sobre o tempo em que os dois começaram a namorar. Numa dessas conversas ele me disse que certa vez ela mostraria para ele o poema escrito por mim. Segundo me disse o amigo, o poema era guardado com o maior cuidado. Aquilo me deixara horrorizado. Ele também, sentindo-se pouco à vontade, quase contou para ela que o poema não era dele. Não contou. As vezes em que pensou em contar foram muitas, mas jamais contaria.

Eu achava bom vê-los juntos. Ele é meu amigo, e é bom imaginar que uma pequena contribuição minha pode ter ocorrido para que os dois ficassem um com o outro. Com o passar do tempo afastei-me deles, mas coisa comum era vê-los passeando, sempre deixando transparecer contentamento. Foram se tornando raras as vezes em que eu os via, até o ponto de praticamente não vê-los mais; de vez em quando eu ficava sabendo que estavam bem.

Um dia desses, lendo um convite de casamento, eu soube que ele se casaria. Com outra.

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