Quando 
                                                          fui requisitado para 
                                                          a tarefa, éramos 
                                                          colegas de sala. Ele, 
                                                          paquerando uma garota 
                                                          há algum tempo, 
                                                          pediu-me para escrever 
                                                          algo para ela, como 
                                                          se fosse ele o autor 
                                                          do que seria escrito. 
                                                          O poema – foi 
                                                          o que ele me pediu – 
                                                          acompanharia um presente. 
                                                          Topei escrevê-lo, 
                                                          mas não sem deixar 
                                                          bem claro que, caso 
                                                          a conquista malograsse, 
                                                          não poderia ele 
                                                          me culpar de forma alguma. 
                                                          Afirmei também, 
                                                          alegando experiência 
                                                          própria, duvidar 
                                                          do poder da poesia como 
                                                          tática para a 
                                                          conquista. (Lembrei-me 
                                                          de um trecho lido no 
                                                          prefácio do livro 
                                                          “Cyrano de Bergerac”: 
                                                          “Rostand imediatamente 
                                                          relacionou a situação 
                                                          com a infeliz história 
                                                          sentimental de Cyrano 
                                                          de Bergerac, que, incapaz 
                                                          de conquistar para si 
                                                          mesmo o afeto de Roxana, 
                                                          a mulher amada, conquistou-o 
                                                          através de palavras 
                                                          apaixonadas, em nome 
                                                          do outro, para seu jovem 
                                                          amigo Cristiano.”)
                                                        Escrito 
                                                          o poema, pedi a ele 
                                                          que me mantivesse informado 
                                                          sobre a peleja. Foi 
                                                          com satisfação 
                                                          que fiquei sabendo que 
                                                          sairiam num sábado. 
                                                          Mais satisfação 
                                                          ainda foi constatar 
                                                          que o fato de eles saírem 
                                                          aos sábados foi 
                                                          se tornando a regra, 
                                                          até o ponto em 
                                                          que o namoro já 
                                                          era uma regra, e não 
                                                          seria exagerado afirmar 
                                                          que o amor é 
                                                          que parecia estar ditando 
                                                          as regras. O tempo passava 
                                                          e a relação 
                                                          se consolidava, como 
                                                          se ela fosse a Monica 
                                                          e ele fosse o Eduardo.
                                                        Aos domingos, 
                                                          eu geralmente almoçava 
                                                          na casa dele. Ela também 
                                                          se fazia presente. Como 
                                                          observador, eu freqüentemente 
                                                          pensava que aquela história 
                                                          seria coisa para casamento. 
                                                          Enquanto essa hora não 
                                                          vinha, ele e eu conversávamos 
                                                          amiúde sobre 
                                                          o tempo em que os dois 
                                                          começaram a namorar. 
                                                          Numa dessas conversas 
                                                          ele me disse que certa 
                                                          vez ela mostraria para 
                                                          ele o poema escrito 
                                                          por mim. Segundo me 
                                                          disse o amigo, o poema 
                                                          era guardado com o maior 
                                                          cuidado. Aquilo me deixara 
                                                          horrorizado. Ele também, 
                                                          sentindo-se pouco à 
                                                          vontade, quase contou 
                                                          para ela que o poema 
                                                          não era dele. 
                                                          Não contou. As 
                                                          vezes em que pensou 
                                                          em contar foram muitas, 
                                                          mas jamais contaria.
                                                        Eu achava 
                                                          bom vê-los juntos. 
                                                          Ele é meu amigo, 
                                                          e é bom imaginar 
                                                          que uma pequena contribuição 
                                                          minha pode ter ocorrido 
                                                          para que os dois ficassem 
                                                          um com o outro. Com 
                                                          o passar do tempo afastei-me 
                                                          deles, mas coisa comum 
                                                          era vê-los passeando, 
                                                          sempre deixando transparecer 
                                                          contentamento. Foram 
                                                          se tornando raras as 
                                                          vezes em que eu os via, 
                                                          até o ponto de 
                                                          praticamente não 
                                                          vê-los mais; de 
                                                          vez em quando eu ficava 
                                                          sabendo que estavam 
                                                          bem.
                                                        Um dia 
                                                          desses, lendo um convite 
                                                          de casamento, eu soube 
                                                          que ele se casaria. 
                                                          Com outra.